sexta-feira, 13 de abril de 2012

Deus ou o Big Bang?

Deus ou o Big Bang?
Dom Redovino Rizzardo, cs - Bispo de Dourados - MS

Há cristãos que continuam convictos de que, para serem coerentes com a fé que receberam da Igreja, precisam recorrer a uma interpretação literal da Bíblia, como se ela fosse um livro de ciências naturais ou de história universal. Para o Papa Bento XVI, ao invés, nada impede que se acredite que o universo tenha tido a sua origem num Big Bang conduzido por Deus.
Foi o que deixou entrever na quinta-feira, dia 6 de janeiro de 2011, festa da Epifania de Jesus, data em que o Evangelho de Mateus fala de uma estrela que conduziu uns magos desde o Oriente até Belém: «Há pessoas que querem nos fazer acreditar que o universo é resultado do acaso. Pelo contrário, contemplando o universo, somos convidados a pensar na sabedoria de Deus e na sua criatividade inacabável».
Foram várias as vezes em que o Papa se pronunciou sobre a evolução do universo, apesar de raramente se haver referido ao Big Bang, a imponente explosão que os cientistas acreditam ter ocorrido há 14 bilhões de anos, da qual se iniciou a formação do cosmos.
Para Bento XVI, a ciência, por si só, não é suficiente para chegar ao âmago da realidade, que só pode ser apreendida através do acordo entre inteligência e fé, ciência e revelação, as duas luzes que guiaram os Reis Magos a Belém. Em sua opinião, algumas teorias científicas apoquentam a mente e deixam sem resposta as questões mais importantes: «Só é possível compreender a beleza do mundo, o seu mistério, a sua grandeza e a sua racionalidade se nos deixarmos guiar por Deus, criador do céu e da terra».
Se a religião não pode tomar o lugar da ciência, esta, por sua vez, deve perder seu orgulho de autossuficiência e entender que muito da realidade escapa ao seu alcance. Numa palavra, imitar o exemplo dos Magos, autênticos buscadores da verdade: apesar de sábios – ou melhor, por isso mesmo –, não se envergonharam de pedir auxílio à religião para chegar a Belém. Eram homens de ciência – em seu sentido mais amplo – que observavam o cosmos e o consideravam um grande livro, cheio de sinais e mensagens de Deus para o homem. Uma ciência que, ao invés de se julgar autossuficiente, se abria a revelações e mensagens divinas.
Assim sendo, o título que dei ao artigo deveria ser mudado: ao invés de “Deus ou o Big Bang”, o certo seria “Deus e o Big Bang”.
Não são poucos os que defendem o criacionismo e combatem o evolucionismo porque julgam que somente assim se pode salvar a existência e a ação de Deus. Para eles, criação e evolução não podem andar juntas. Para manter intacta a fé, apegam-se ao relato da criação como as primeiras páginas da Bíblia o descrevem –, no máximo, substituindo os seis dias por períodos, ciclos ou eras.
Entretanto, criação e evolução fazem parte de um único processo: o universo teve início num ato de amor de Deus e continua sendo desenvolvido e completado por ele – sobretudo através da atividade humana – ao longo dos tempos. A criação aconteceu no passado e acontece no presente, num processo lento e constante, resultado de uma infinidade de altos e baixos, que deveriam conduzir progressivamente a humanidade a níveis cada vez mais elevados.
“Deveriam”, porque o pecado fez sua aparição no mundo e, com ele, tudo ficou mais complicado. Em todo caso, quem não se deixa contaminar por ele, descobrirá que o universo, a natureza e principalmente o ser humano refletem muito da beleza, da grandeza e do amor de Deus. Nem precisará de argumentos que provem a existência de Deus: em toda a parte, ser-lhe-á visível o milagre divino.
É também por isso que, quanto mais cristão ele for, mais se preocupará com o planeta, para que a criação continue seu caminho evolutivo onde o espírito e a vida tenham a primazia. Nesse processo, ao invés de um obstáculo, a fé se transformará num facho luminoso a guiar a inteligência e a atividade humana, até que se realize a utopia vislumbrada pelos profetas: «Vou criar um novo céu e uma nova terra» (Is 65, 17), e realizada por Jesus: «No final, Cristo entregará o Reino a Deus Pai, depois de ter destruído as forças do mal. E quando todas as coisas lhe tiverem sido submetidas, ele também se submeterá àquele que tudo lhe submeteu, para que Deus seja tudo em todos» (1Cor 15,24.28).

Nenhum comentário:

Postar um comentário